William Bonner interrompeu Dilma 21 vezes. Entrevista?
Apresentador do Jornal Nacional aparece como presidente da República nas
redes sociais; um dia depois de interromper a presidente Dilma Rousseff
21 vezes em entrevista de 15 minutos, William Bonner é visto não como
jornalista, mas como político; primeira pergunta dele, com a expressão
"escândalo de corrupção" citada sete vezes, durou um minuto e 39
segundos, quase 10% do tempo total do encontro; tentativa de massacre
teve caretas, um dedo em riste de uma transtornada Patrícia Poeta e
gesto em dobro do próprio Bonner; desequilíbrio histórico
247 – O editor-chefe e âncora do Jornal Nacional, William Bonner, nunca foi tão mencionado nas redes sociais – e mesmo nos portais de notícias – como na noite desta segunda-feira 18, após sua entrevista com a presidente Dilma Rousseff, na companhia de Patrícia Poeta.
Como noticiou o 247, a entrevista foi, na verdade, uma ação eleitoral do principal noticiário da televisão brasileira, com direito a interrupções, perguntas quilométricas e dedo em riste por parte dos apresentadores. Em sua primeira pergunta, Bonner repetiu sete vezes a palavra "corrupção".
No cálculo do jornalista Jeff Benício, que escreve no blog Sala de TV no portal Terra, o âncora interrompeu a candidata à reeleição nada menos que 21 vezes em 15 minutos e 52 segundos. O embate entre ele e a presidente durou 7 minutos e 15 segundos, diz o blogueiro.
Depois da única pergunta de Patrícia Poeta, que até então era espectadora, Bonner interrompeu Dilma ainda mais cinco vezes para, como disse ele, "falar de economia". Houve momentos em que a petista precisou continuar sua resposta da pergunta anterior quando já estava na seguinte. "Então, Bonner, como eu estava dizendo...", alfinetou.
Pouco depois, outro embate deixou o momento mais tenso. Enquanto Dilma apresentava suas declarações finais como candidata, Bonner a cortou novamente: "nosso tempo está acabando". Ela reagiu com a pergunta: "acabou?". Mais de uma vez os apresentadores agradeceram a presença da presidente no programa enquanto ela ainda falava.
Da parte de Dilma Rousseff, em nenhum momento a candidata perdeu a calma, apensa tentava terminar seu raciocínio quando era cortada ao vivo. Entre as três entrevistas – o JN também chamou à bancada o candidato Aécio Neves, do PSDB, e Eduardo Campos, que era postulante pelo PSB, mas morreu em um acidente aéreo no dia seguinte – certamente essa foi a mais incisiva.
Nas redes sociais, Bonner foi alvo de elogios, críticas e até de pedidos para que se candidate à Presidência da República. Imediatamente após a entrevista, os quatro primeiro assuntos mais comentados no Twitter nacional se referiam ao tema, sendo o primeiro deles o nome do âncora: "Bonner".
Globo deu seu recado: faz campanha contra Dilma
Por Ricardo Amaral
A entrevista com a presidenta Dilma Rousseff expôs, com rara contundência, a parcialidade da Globo na cobertura do governo e do PT. Utilizando manhas de quem passou pelo pau-de-arara, Dilma pôs abaixo a tentativa da Globo de parecer “isenta” nesse capítulo das eleições. Isso não é banal, no momento em que a credibilidade da imprensa hegemônica segue abalada pelo fiasco histórico da “operação Copa”.
A credibilidade do jornalismo da Globo saiu mais uma vez arranhada pelos esgares de William Bonner e Patrícia Poeta. As expressões de contrariedade, os dedos em riste e as interrupções grosseiras falaram mais ao telespectador do que o conteúdo de perguntas e respostas. Por algum tempo, tudo que se disser no JN contra Dilma será recebido com suspeita, porque a mensagem mais forte do programa foi: eles não gostam dela.
Dos 16 minutos cronometrados, Dilma falou 10 minutos e meio; Bonner, 4 e meio, e Patrícia quase 1 minuto. Dá 65% para ela e 35% para eles. Dilma pronunciou 1.383 palavras, contra 980 da dupla (766 só do Bonner), o que dá 60% x 40%. Isso é escore de debate, não de entrevista. A dupla encaixou 26 acusações ao governo e ao PT; algumas, com ponto de exclamação.
Nos quatro blocos temáticos (corrupção, mensalão, saúde e economia) Bonner lançou no ar 13 pontos de interrogação, e Patrícia, dois. A presidenta foi interrompida 19 vezes. Tomou dedo na cara de Bonner e de Patrícia, que reclamou de uma resposta com um soquinho na mesa. Isso não é comportamento de jornalista. Na entrevista com Aécio Neves – que muitos acharam “dura”, embora tenha sido apenas previsível – a dupla fez quatro interrupções e cinco reiterações de perguntas.
Aprendi ainda foca que o segredo de uma entrevista ao vivo é dominar o assunto e buscar a pergunta seguinte na resposta do entrevistado. É uma arte difícil. Patrícia Poeta nunca soube fazer. Bonner acha que sabe – e que sabe muito. Por isso saiu-se ainda pior que a colega. Basta discordar do enunciado para desnorteá-los. Não sabem do que estão falando; seguem o roteiro e fazem cara de argúcia (com Dilma, usavam ponto eletrônico!).
Maus entrevistadores são incapazes de ouvir respostas e dialogar com o argumento do entrevistado. Não é só amadorismo; é presunção. Globais se consideram mais importantes que os candidatos. Acham-se a própria notícia. Diante da contradita, repetem a pergunta até se perderem. No limite, apelam para a fórmula binária: “eu digo isso; sim ou não?” Eduardo Campos saiu-se muito bem dessa briga com bêbados. Aécio tropeçou e caiu.
Para a Globo, pouco importa expor os editores chefe e assistente do JN a mais um vexame profissional. A Globo não quer ouvir respostas; quer repetir (e tentar sancionar) o próprio discurso. Bonner deve ter ensaiado em casa o que considerava seu momento de glória: chamar de corruptos os petistas do mensalão (“Eram corruptos!”), na cara da presidenta da República. Que audácia, hein, patrão…
Na primeira pergunta (69 segundos), a palavra corrupção foi repetida sete vezes; e estamos conversados. Depois de 12 anos (“mais de uma década, candidata!”) há “filas e filas nos hospitais”, cidadãos “muitas vezes são atendidos em macas”, “muitas vezes não conseguem fazer um exame de diagnóstico”. O país tem “inflação alta, indústrias com estoques elevados, ameaça de desemprego ali na frente”.
Repetir os mantras do noticiário negativo – sem de fato abrir a discussão sobre eles – era o primeiro dever de casa. O segundo era desconcertar a entrevistada, e foi aí que a bomba explodiu no colo dos entrevistadores. Dilma não abriu mão de responder as perguntas, retomando o fio da meada a cada interrupção. Advertida, fez-se de sonsa e continuou respondendo o que quis.
O jogo foi chato na maior parte do tempo, mas Dilma não entregou a posse de bola, não cedeu o controle da entrevista. E foram eles, William e Patrícia, que ficaram visivelmente desconcertados, a ponto de perder o respeito pela entrevistada – que o merecia, mesmo que não fosse presidenta da República.
Dilma não disse aos interrogadores o que eles queriam que ela dissesse, exceto ao concordar com Patrícia Poeta que “a saúde no país não é minimamente razoável”. Um pontinho vencido, foi tudo que conseguiram arrancar da interrogada. Por isso, o destaque nos sites da Globo foi o previsível silêncio de Dilma sobre o julgamento do mensalão – outra evidência de que eles consideram suas perguntas mais importantes do que as respostas da presidenta da República.
Qualquer analista dirá que a presidenta desperdiçou a oportunidade de ter sido mais assertiva da propaganda de seu governo. Quinze minutos no JN são uma grande chance de falar para milhões de eleitores, mas Dilma preferiu debater com Patrícia Poeta e William Bonner.
Ela passou informações relevantes: a inflação de julho ficou próxima de zero; o Mais Médicos atende 50 milhões de pessoas; o SAMU atende 149 milhões. Disse que o país enfrenta a crise sem demitir, sem arrochar salários e até diminuindo impostos. Podia ter dito muito mais, mas a disputa foi mais concentrada na forma que no conteúdo. E foi aí que Dilma venceu.
Dilma sorriu na medida certa e manteve-se serena durante todo o programa. Impôs-se um comportamento de presidenta da República, que contrastou, aos olhos dos telespectadores, com a atitude desrespeitosa e antiprofissional dos entrevistadores. Mesmo restrita a um cerimonial televisivo, foi uma sinalização relevante para uma imprensa cada vez mais assanhada no papel de oposição: digam o que quiserem, mas respeitem a presidenta eleita de todos os brasileiros.
Do que têm medo a Globo e os três Marinhos?
A postura agressiva dos apresentadores do Jornal Nacional na noite de ontem, que atingiu seu ápice quando Patrícia Poeta colocou o dedinho no rosto da presidente Dilma Rousseff, escancara que as Organizações Globo farão o que estiver a seu alcance, nos próximos dois meses, para impedir sua reeleição; aparentemente, os irmãos Roberto Irineu, João Roberto e José Roberto Marinho tratam esta eleição como uma questão de vida ou morte; entre os motivos possíveis, estão a autuação milionária da Receita Federal, o receio de que o país avance na democratização da mídia e a percepção de que a Globo, alvo dos protestos de junho por ter apoiado a ditadura militar, não é mais capaz de ditar os rumos do país como no passado; juntos, os três irmãos formam a família midiática mais rica do mundo, com um patrimônio de US$ 28,9 bilhões, que foi formado graças à concentração de poder; no entanto, audiência declinante desafia um império que extravasa seu nervosismo, como aconteceu na noite de ontem; será que a presidente Dilma é o lobo mau?
Marco Damiani, 247 – Donos do maior patrimônio pessoal entre todos os empresários de mídia do mundo, como o australiano Ruppert Murdoch, do grupo Media News, ou o americano Ted Turner, da rede CNN, os três irmãos Marinho – João Roberto, Roberto Irineu e José Roberto – consideram ter mais de um bilhão de motivos para atuarem, com sua poderosa máquina editorial, contra a reeleição da presidente Dilma Rousseff. Nota sobre nota, eles têm, juntos, uma fortuna estimada pela revista Forbes em US$ 28,9 bilhões (R$ 74,2 bilhões de reais). Porém, com mais quatro anos de Dilma no Palácio do Planalto, os três temem perder dinheiro, prestígio e influência em doses imprevisíveis. Podem ser bastante fortes.
No ano passado, a Receita Federal venceu no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) uma disputa com a Globo de R$ 713 milhões. Hoje, a conta ainda não saudada está em mais de R$ 1 bilhão. Por outro lado, a reeleição da presidente vai, necessariamente, aquecer o debate sobre a regulação do funcionamento do setor de mídia no Brasil. Pilares da base do gigantismo da Globo, como propriedades cruzadas e presença majoritária em múltiplas áreas de atuação, configuram um oligopólio que fatura, anualmente, cerca de R$ 10 bilhões. É essa espécie de fábrica de fazer dinheiro, erguida a partir do período dos militares no poder do Brasil (1964-1985) e movida pelo B.V. (o famoso bônus de veiculação), que se vê ameaçada pela presidente candidata.
Um terceiro, mas não menos importante elemento, é o público em si. Em junho do ano passado, uma parte do vandalismo em que as manifestações degeneraram foi dirigido contra a Globo. Esterco chegou a ser jogado nas paredes da sede da emissora em São Paulo. A pressão popular sobre carros adesivados da emissora passou a ser um fato cotidiano, e sempre arriscado, na vida dos profissionais da empresa.
BELIGERÂNCIA NO DNA - É natural, na defesa de seus interesses bilionários, que os Marinho usem todos os canhões ao seu dispor. A beligerância, de resto, está no DNA do grupo empresarial que eles herdaram do pai. A Globo nasceu com obsessão pelo poder. A estratégia do empresário Roberto Marinho foi, desde as primeiras transmissões, em abril de 1965, exatamente um ano depois de os militares brasileiros derrubarem o presidente João Goulart, a de servir ao regime. Não há interpretação histórica que possa superar esse fato.
A Globo, apesar de algumas linhas de autocrítica publicadas no jornal O Globo por ocasião do cinquentenário do golpe militar, no ano passado, não quer cortar suas raízes com o autoritarismo. Pelo simples motivo de que foi a antítese da democracia que estabeleceu o modelo de concentração que a beneficiou. As Organizações enxergam a democracia como o regime que necessariamente vai enfraquecer seu poder, à medida em que permite a existência e o florescimento de outras fórmulas empresariais.
O nervosismo do âncora William Bonner e a descortesia da apresentadora Patrícia Poeta, ontem, diante de Dilma, na entrevista no Jornal Nacional, revelaram apenas a ponta do iceberg de interesses escondidos pela Globo em sua propalada isenção editorial. Não está no DNA da emissora ser isenta, ao contrário. Muito menos têm havido equilíbrio por parte da emissora no noticiário da atual sucessão presidencial. Pesquisadores da Uerj já havia mostrado que o JN dedicou, entre 1º de janeiro e 31 de julho, 83 minutos de noticiário avaliado por ele como negativo para Dilma contra 3 minutos de informações apontadas como positivas.
JN PERDEU IBOPE NOS ÚLTIMOS ANOS - Para tomar-se, apenas, os investimentos do governo federal em publicidade, o que se tem é que eles diminuíram para a Globo a partir da introdução continuada de filtros técnicos para a aplicação das verbas. Acontece que a audiência da Globo como um todo, e em horários nunca antes ameaçados, está diminuindo. Apenas o Jornal Nacional, por exemplo, perdeu mais de 20 pontos no Ibope nos últimos anos. A introdução de novos mecanismos de medição de público, de outra parte, também mostra que o poderio real das Organizações Globo é declinante, no sentido do alcance e influência sobre público.
Em 1982, a Globo tentou ditar o resultados das eleições para governador do Rio de Janeiro, no que ficou conhecido como o escândalo da pró-consult – a assessoria que contava os votos em paralelo à Justiça Eleitoral. Em 1989, como o então todo poderoso global Boni admitiu em biografia festiva, a emissora manipulou o debate presidencial entre os candidatos Lula e Collor e usou, claro, o Jornal Nacional para desequilibrar ainda mais a cena real daquele disputa. Em ambos os casos, a Globo procurou interferir na disputa em seus momentos finais.
Ontem, com a chamada entrevista em que a presidente Dilma foi interrompida 21 vezes, em 15 minutos de conversa, pelo âncora do JN, a Globo mostrou que partiu para o ataque desde o primeiro minuto. Certamente porque sabe, com seus sofisticados instrumentos de aferição dos humores da população, que enfrenta cada vez mais dificuldade para impor a vontade de seus herdeiros ao público.
Fontes: Brasil247 , Brasil247 (2) , Brasil247 (3)
247 – O editor-chefe e âncora do Jornal Nacional, William Bonner, nunca foi tão mencionado nas redes sociais – e mesmo nos portais de notícias – como na noite desta segunda-feira 18, após sua entrevista com a presidente Dilma Rousseff, na companhia de Patrícia Poeta.
Como noticiou o 247, a entrevista foi, na verdade, uma ação eleitoral do principal noticiário da televisão brasileira, com direito a interrupções, perguntas quilométricas e dedo em riste por parte dos apresentadores. Em sua primeira pergunta, Bonner repetiu sete vezes a palavra "corrupção".
No cálculo do jornalista Jeff Benício, que escreve no blog Sala de TV no portal Terra, o âncora interrompeu a candidata à reeleição nada menos que 21 vezes em 15 minutos e 52 segundos. O embate entre ele e a presidente durou 7 minutos e 15 segundos, diz o blogueiro.
Depois da única pergunta de Patrícia Poeta, que até então era espectadora, Bonner interrompeu Dilma ainda mais cinco vezes para, como disse ele, "falar de economia". Houve momentos em que a petista precisou continuar sua resposta da pergunta anterior quando já estava na seguinte. "Então, Bonner, como eu estava dizendo...", alfinetou.
Pouco depois, outro embate deixou o momento mais tenso. Enquanto Dilma apresentava suas declarações finais como candidata, Bonner a cortou novamente: "nosso tempo está acabando". Ela reagiu com a pergunta: "acabou?". Mais de uma vez os apresentadores agradeceram a presença da presidente no programa enquanto ela ainda falava.
Da parte de Dilma Rousseff, em nenhum momento a candidata perdeu a calma, apensa tentava terminar seu raciocínio quando era cortada ao vivo. Entre as três entrevistas – o JN também chamou à bancada o candidato Aécio Neves, do PSDB, e Eduardo Campos, que era postulante pelo PSB, mas morreu em um acidente aéreo no dia seguinte – certamente essa foi a mais incisiva.
Nas redes sociais, Bonner foi alvo de elogios, críticas e até de pedidos para que se candidate à Presidência da República. Imediatamente após a entrevista, os quatro primeiro assuntos mais comentados no Twitter nacional se referiam ao tema, sendo o primeiro deles o nome do âncora: "Bonner".
Globo deu seu recado: faz campanha contra Dilma
Por Ricardo Amaral
A entrevista com a presidenta Dilma Rousseff expôs, com rara contundência, a parcialidade da Globo na cobertura do governo e do PT. Utilizando manhas de quem passou pelo pau-de-arara, Dilma pôs abaixo a tentativa da Globo de parecer “isenta” nesse capítulo das eleições. Isso não é banal, no momento em que a credibilidade da imprensa hegemônica segue abalada pelo fiasco histórico da “operação Copa”.
A credibilidade do jornalismo da Globo saiu mais uma vez arranhada pelos esgares de William Bonner e Patrícia Poeta. As expressões de contrariedade, os dedos em riste e as interrupções grosseiras falaram mais ao telespectador do que o conteúdo de perguntas e respostas. Por algum tempo, tudo que se disser no JN contra Dilma será recebido com suspeita, porque a mensagem mais forte do programa foi: eles não gostam dela.
Dos 16 minutos cronometrados, Dilma falou 10 minutos e meio; Bonner, 4 e meio, e Patrícia quase 1 minuto. Dá 65% para ela e 35% para eles. Dilma pronunciou 1.383 palavras, contra 980 da dupla (766 só do Bonner), o que dá 60% x 40%. Isso é escore de debate, não de entrevista. A dupla encaixou 26 acusações ao governo e ao PT; algumas, com ponto de exclamação.
Nos quatro blocos temáticos (corrupção, mensalão, saúde e economia) Bonner lançou no ar 13 pontos de interrogação, e Patrícia, dois. A presidenta foi interrompida 19 vezes. Tomou dedo na cara de Bonner e de Patrícia, que reclamou de uma resposta com um soquinho na mesa. Isso não é comportamento de jornalista. Na entrevista com Aécio Neves – que muitos acharam “dura”, embora tenha sido apenas previsível – a dupla fez quatro interrupções e cinco reiterações de perguntas.
Aprendi ainda foca que o segredo de uma entrevista ao vivo é dominar o assunto e buscar a pergunta seguinte na resposta do entrevistado. É uma arte difícil. Patrícia Poeta nunca soube fazer. Bonner acha que sabe – e que sabe muito. Por isso saiu-se ainda pior que a colega. Basta discordar do enunciado para desnorteá-los. Não sabem do que estão falando; seguem o roteiro e fazem cara de argúcia (com Dilma, usavam ponto eletrônico!).
Maus entrevistadores são incapazes de ouvir respostas e dialogar com o argumento do entrevistado. Não é só amadorismo; é presunção. Globais se consideram mais importantes que os candidatos. Acham-se a própria notícia. Diante da contradita, repetem a pergunta até se perderem. No limite, apelam para a fórmula binária: “eu digo isso; sim ou não?” Eduardo Campos saiu-se muito bem dessa briga com bêbados. Aécio tropeçou e caiu.
Para a Globo, pouco importa expor os editores chefe e assistente do JN a mais um vexame profissional. A Globo não quer ouvir respostas; quer repetir (e tentar sancionar) o próprio discurso. Bonner deve ter ensaiado em casa o que considerava seu momento de glória: chamar de corruptos os petistas do mensalão (“Eram corruptos!”), na cara da presidenta da República. Que audácia, hein, patrão…
Na primeira pergunta (69 segundos), a palavra corrupção foi repetida sete vezes; e estamos conversados. Depois de 12 anos (“mais de uma década, candidata!”) há “filas e filas nos hospitais”, cidadãos “muitas vezes são atendidos em macas”, “muitas vezes não conseguem fazer um exame de diagnóstico”. O país tem “inflação alta, indústrias com estoques elevados, ameaça de desemprego ali na frente”.
Repetir os mantras do noticiário negativo – sem de fato abrir a discussão sobre eles – era o primeiro dever de casa. O segundo era desconcertar a entrevistada, e foi aí que a bomba explodiu no colo dos entrevistadores. Dilma não abriu mão de responder as perguntas, retomando o fio da meada a cada interrupção. Advertida, fez-se de sonsa e continuou respondendo o que quis.
O jogo foi chato na maior parte do tempo, mas Dilma não entregou a posse de bola, não cedeu o controle da entrevista. E foram eles, William e Patrícia, que ficaram visivelmente desconcertados, a ponto de perder o respeito pela entrevistada – que o merecia, mesmo que não fosse presidenta da República.
Dilma não disse aos interrogadores o que eles queriam que ela dissesse, exceto ao concordar com Patrícia Poeta que “a saúde no país não é minimamente razoável”. Um pontinho vencido, foi tudo que conseguiram arrancar da interrogada. Por isso, o destaque nos sites da Globo foi o previsível silêncio de Dilma sobre o julgamento do mensalão – outra evidência de que eles consideram suas perguntas mais importantes do que as respostas da presidenta da República.
Qualquer analista dirá que a presidenta desperdiçou a oportunidade de ter sido mais assertiva da propaganda de seu governo. Quinze minutos no JN são uma grande chance de falar para milhões de eleitores, mas Dilma preferiu debater com Patrícia Poeta e William Bonner.
Ela passou informações relevantes: a inflação de julho ficou próxima de zero; o Mais Médicos atende 50 milhões de pessoas; o SAMU atende 149 milhões. Disse que o país enfrenta a crise sem demitir, sem arrochar salários e até diminuindo impostos. Podia ter dito muito mais, mas a disputa foi mais concentrada na forma que no conteúdo. E foi aí que Dilma venceu.
Dilma sorriu na medida certa e manteve-se serena durante todo o programa. Impôs-se um comportamento de presidenta da República, que contrastou, aos olhos dos telespectadores, com a atitude desrespeitosa e antiprofissional dos entrevistadores. Mesmo restrita a um cerimonial televisivo, foi uma sinalização relevante para uma imprensa cada vez mais assanhada no papel de oposição: digam o que quiserem, mas respeitem a presidenta eleita de todos os brasileiros.
Do que têm medo a Globo e os três Marinhos?
A postura agressiva dos apresentadores do Jornal Nacional na noite de ontem, que atingiu seu ápice quando Patrícia Poeta colocou o dedinho no rosto da presidente Dilma Rousseff, escancara que as Organizações Globo farão o que estiver a seu alcance, nos próximos dois meses, para impedir sua reeleição; aparentemente, os irmãos Roberto Irineu, João Roberto e José Roberto Marinho tratam esta eleição como uma questão de vida ou morte; entre os motivos possíveis, estão a autuação milionária da Receita Federal, o receio de que o país avance na democratização da mídia e a percepção de que a Globo, alvo dos protestos de junho por ter apoiado a ditadura militar, não é mais capaz de ditar os rumos do país como no passado; juntos, os três irmãos formam a família midiática mais rica do mundo, com um patrimônio de US$ 28,9 bilhões, que foi formado graças à concentração de poder; no entanto, audiência declinante desafia um império que extravasa seu nervosismo, como aconteceu na noite de ontem; será que a presidente Dilma é o lobo mau?
Marco Damiani, 247 – Donos do maior patrimônio pessoal entre todos os empresários de mídia do mundo, como o australiano Ruppert Murdoch, do grupo Media News, ou o americano Ted Turner, da rede CNN, os três irmãos Marinho – João Roberto, Roberto Irineu e José Roberto – consideram ter mais de um bilhão de motivos para atuarem, com sua poderosa máquina editorial, contra a reeleição da presidente Dilma Rousseff. Nota sobre nota, eles têm, juntos, uma fortuna estimada pela revista Forbes em US$ 28,9 bilhões (R$ 74,2 bilhões de reais). Porém, com mais quatro anos de Dilma no Palácio do Planalto, os três temem perder dinheiro, prestígio e influência em doses imprevisíveis. Podem ser bastante fortes.
No ano passado, a Receita Federal venceu no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) uma disputa com a Globo de R$ 713 milhões. Hoje, a conta ainda não saudada está em mais de R$ 1 bilhão. Por outro lado, a reeleição da presidente vai, necessariamente, aquecer o debate sobre a regulação do funcionamento do setor de mídia no Brasil. Pilares da base do gigantismo da Globo, como propriedades cruzadas e presença majoritária em múltiplas áreas de atuação, configuram um oligopólio que fatura, anualmente, cerca de R$ 10 bilhões. É essa espécie de fábrica de fazer dinheiro, erguida a partir do período dos militares no poder do Brasil (1964-1985) e movida pelo B.V. (o famoso bônus de veiculação), que se vê ameaçada pela presidente candidata.
Um terceiro, mas não menos importante elemento, é o público em si. Em junho do ano passado, uma parte do vandalismo em que as manifestações degeneraram foi dirigido contra a Globo. Esterco chegou a ser jogado nas paredes da sede da emissora em São Paulo. A pressão popular sobre carros adesivados da emissora passou a ser um fato cotidiano, e sempre arriscado, na vida dos profissionais da empresa.
BELIGERÂNCIA NO DNA - É natural, na defesa de seus interesses bilionários, que os Marinho usem todos os canhões ao seu dispor. A beligerância, de resto, está no DNA do grupo empresarial que eles herdaram do pai. A Globo nasceu com obsessão pelo poder. A estratégia do empresário Roberto Marinho foi, desde as primeiras transmissões, em abril de 1965, exatamente um ano depois de os militares brasileiros derrubarem o presidente João Goulart, a de servir ao regime. Não há interpretação histórica que possa superar esse fato.
A Globo, apesar de algumas linhas de autocrítica publicadas no jornal O Globo por ocasião do cinquentenário do golpe militar, no ano passado, não quer cortar suas raízes com o autoritarismo. Pelo simples motivo de que foi a antítese da democracia que estabeleceu o modelo de concentração que a beneficiou. As Organizações enxergam a democracia como o regime que necessariamente vai enfraquecer seu poder, à medida em que permite a existência e o florescimento de outras fórmulas empresariais.
O nervosismo do âncora William Bonner e a descortesia da apresentadora Patrícia Poeta, ontem, diante de Dilma, na entrevista no Jornal Nacional, revelaram apenas a ponta do iceberg de interesses escondidos pela Globo em sua propalada isenção editorial. Não está no DNA da emissora ser isenta, ao contrário. Muito menos têm havido equilíbrio por parte da emissora no noticiário da atual sucessão presidencial. Pesquisadores da Uerj já havia mostrado que o JN dedicou, entre 1º de janeiro e 31 de julho, 83 minutos de noticiário avaliado por ele como negativo para Dilma contra 3 minutos de informações apontadas como positivas.
JN PERDEU IBOPE NOS ÚLTIMOS ANOS - Para tomar-se, apenas, os investimentos do governo federal em publicidade, o que se tem é que eles diminuíram para a Globo a partir da introdução continuada de filtros técnicos para a aplicação das verbas. Acontece que a audiência da Globo como um todo, e em horários nunca antes ameaçados, está diminuindo. Apenas o Jornal Nacional, por exemplo, perdeu mais de 20 pontos no Ibope nos últimos anos. A introdução de novos mecanismos de medição de público, de outra parte, também mostra que o poderio real das Organizações Globo é declinante, no sentido do alcance e influência sobre público.
Em 1982, a Globo tentou ditar o resultados das eleições para governador do Rio de Janeiro, no que ficou conhecido como o escândalo da pró-consult – a assessoria que contava os votos em paralelo à Justiça Eleitoral. Em 1989, como o então todo poderoso global Boni admitiu em biografia festiva, a emissora manipulou o debate presidencial entre os candidatos Lula e Collor e usou, claro, o Jornal Nacional para desequilibrar ainda mais a cena real daquele disputa. Em ambos os casos, a Globo procurou interferir na disputa em seus momentos finais.
Ontem, com a chamada entrevista em que a presidente Dilma foi interrompida 21 vezes, em 15 minutos de conversa, pelo âncora do JN, a Globo mostrou que partiu para o ataque desde o primeiro minuto. Certamente porque sabe, com seus sofisticados instrumentos de aferição dos humores da população, que enfrenta cada vez mais dificuldade para impor a vontade de seus herdeiros ao público.
Fontes: Brasil247 , Brasil247 (2) , Brasil247 (3)