Papa Francisco e Fidel Castro trocam Livros e CDS, e comentam a sociedade atual
Foi um Raúl Castro sorridente que saiu do encontro mantido à tarde com o papa Francisco, no Palácio da Revolução, sede do governo cubano. Naquele que era antecipado como o principal momento politico da visita oficial, a agenda estava dominada pelo histórico reatamento de relações diplomáticas entre Cuba e Estados Unidos, um processo iniciado com a intervenção decidida do líder católico. A reunião, conduzida a portas fechadas por cerca de meia hora, se seguiu a um encontro de 40 minutos com o ex-presidente Fidel Castro, 89 anos, patriarca da revolução comunista de 1959, que passou o poder ao irmão mais novo em 2006.
Os chefes de Estado não fizeram declarações sobre a reunião, que foi apenas noticiada pelos meios oficiais de ambas as partes. Coube ao porta-voz do Vaticano, padre Federico Lombardi, fazer uma breve comunicação à imprensa sobre a reunião com Fidel, que recebeu o pontífice em sua casa, em companhia da mulher, Dalia Soto del Valle, além de filhos e netos. “O papa foi acompanhado de um pequeno grupo de pessoas à residência do Comandante”, disse o porta-voz. Em termos gerais, segundo o padre Lombardi, os dois trataram de “temas da atualidade internacional”.
Fidel e o papa trocaram livros e CDs. O líder cubano escolheu como presente para o visitante o livro Fidel e a religião, produto de suas conversas sobre o tema com o religioso brasileiro Frei Betto, um dos expoentes da Teologia da Libertação — movimento católico surgido nos anos 1960, reunindo padres e bispos com forte atuação política e social, que buscaram uma convergência entre cristianismo e marxismo.
Na chegada ao Palácio da Revolução, Francisco foi recebido por Raúl na entrada do Conselho de Estado, a sede oficial do governo. Bem-humorado, o presidente, de 86 anos, acenou para os jornalistas e posou para fotos com o visitante, diante de um vitral intitulado El sol de América, segundo o relato do site oficial Cubadebate. A seguir, os dois se retiraram para uma reunião reservada, na qual debateram uma agenda semelhante à tratada com Fidel.
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A expectativa dos observadores era de que o presidente cubano apresentasse para o pontífice as duas principais exigências de seu governo para a normalização plena de relações com os EUA. O primeiro deles, mencionado por Raúl no discurso de boas-vindas que fez após o desembarque do papa, no sábado, é a suspensão do embargo americano ao país. A segunda é a recuperação da soberania sobre o território da base naval de Guantánamo, arrendada segundo contrato firmado há mais de um século, com a ilha na prática sob intervenção militar.
Pelo lado de Francisco, vaticanistas apostavam que o próprio caráter discreto do encontro propiciaria a ocasião para abordar questões relacionadas aos direitos humanos em Cuba, inclusive a liberdade de atuação para a Igreja. Embora tenha escolhido não fazer cobranças públicas ao regime de Havana, o papa não deixou de mencionar o assunto no desembarque, quando respondeu ao pronunciamento do anfitrião. Também o processo de paz na Colômbia, citado pelo papa na missa dominical, na Praça da Revolução, estava entre os temas da conversa.
Boa vizinhança
Desde a primeira visita papal à ilha, em 1998, quando João Paulo II foi recebido com todas as honras por Fidel, as relações entre o regime e a Igreja cubana vêm se intensificando. Inicialmente proclamado oficialmente um Estado ateísta, Cuba não apenas revogou o dispositivo constitucional como restabeleceu o Natal como feriado nacional. O cardeal-arcebispo de Havana, Jaime Ortega, teve participação decisiva nas negociações que permitiram, recentemente, a libertação de dezenas de dissidentes que foram autorizados a viajar para a Europa. Desde então, a intervenção dos bispos cubanos tem sido recorrente na defesa de opositores detidos.
Aceno ao entendimento
Na missa que celebrou de manhã na Praça da Revolução, o papa mencionou a importância das negociações de paz desenvolvidas há quase três anos, na capital cubana, entre o governo colombiano e a guerrilha das Farc. Outro fracasso, como os que puseram a fim a três tentativas anteriores, seria “inaceitável”. “Neste momento, me sinto no dever de dirigir o pensamento à querida terra da Colômbia, consciente da importância crucial do momento presente, no qual seus filhos estão buscando construir uma sociedade em paz”, disse.