O risco político de Lula virar ministro em algum ministério
© Fornecido por Deutsche Welle no governo
A entrada de Luiz Inácio Lula da Silva no atual governo, uma guinada há alguns meses considerada impensável, pode abrir uma nova fase na atual crise – e já se revela uma estratégia de elevado risco político tanto para o ex-presidente como para sua sucessora, Dilma Rousseff.
A operação ainda não foi confirmada, mas é dada como certa nos meios políticos em Brasília nesta terça-feira (15/03). Lula foi ao Planalto se reunir com Dilma, e a possibilidade mais aventada é que ele assumiria algum cargo com status de quase "superministro".
Lula ajudaria Dilma em dois pontos sensíveis de sua gestão: recuperação da economia e articulação política para tentar frear o processo de impeachment, que, como teme o Planalto, pode ser acelerado pelos protestos. E, isso, sem debilitar ainda mais o poder da atual presidente.
Ao mesmo tempo, o líder histórico petista teria de alguma forma que convencer a opinião pública de que não está entrando no governo só para escapar da Operação Lava Jato, o que poderia ser entendido como uma admissão de culpa. Na condição de ministro, Lula passaria a ter foro privilegiado, e as ações contra ele seriam julgadas no Supremo Tribunal Federal.
"Sem dúvida é uma forma de o ex-presidente de se blindar das investigações da Lava Jato. O receio é que, sem esta blindagem, ele se torne vulnerável a um pedido de prisão do Ministério Público Federal (MPF)", opina Márcio Coimbra, coordenador do MBA Relações Institucionais do Ibmec/DF. "É uma forma de blindagem, uma vez que não existe uma campanha contra ele, mas provas contundentes em uma série de casos."
Entre manobra política e autodefesa
Há dúvidas sobre qual pasta o ex-presidente aceitaria – Casa Civil ou Secretaria de Governo. A primeira lhe daria, em tese, mais poder, mas inclui também uma grande parte administrativa que Lula não gostaria de ter que lidar para poder se concentrar no rearranjo político do governo.
"Todos nós sabemos que o alvo principal da Operação Lava Jato é o ex-presidente. Ao mesmo tempo que é uma autodefesa, é também uma iniciativa política, com chances muito frágeis, de recompor o governo federal", afirma o cientista político Lúcio Flavio de Almeida, da PUC-SP.
Além do pedido de abertura de impeachment na Câmara dos Deputados, Dilma enfrenta uma ameaça de saída do PMDB, maior partido da base aliada. Especialistas, porém, são cautelosos quanto à capacidade de Lula, nesta altura, de reunir apoio político e social contra o processo.
"A figura de Lula está muito desgastada, inclusive no meio político. A moral do governo, que já está baixa, se tornaria ainda menor. Lula se torna, hoje, mais um problema para Dilma, contaminando ainda mais seu governo. Sua função de 'salvador' pode acabar por ter o efeito oposto", afirma Coimbra.
Para Cláudio Couto, cientista político da Fundação Getúlio Vargas (FGV), se Lula tivesse se tornado ministro há um ano, o cenário seria diferente. Mas agora, opina, talvez seja tarde demais. "Essa operação é de risco e parece um ato de desespero na frente política: pode ser percebida como um desaforo por parte da opinião pública", afirma.
Há o risco também de que a oposição reaja nas instâncias jurídicas após a nomeação de Lula. Os partidos DEM, PPS, PSDB e SD já ameaçaram protocolar, de forma conjunta, uma ação popular em 27 estados contra a entrada do ex-presidente no governo.
Sob pressão das investigações
Por várias vezes, o ex-presidente reclamou com aliados sobre a atuação do Ministério Público na Lava Jato, afirmando que está sofrendo "perseguição política" e uma campanha de difamação.
Lula foi o principal alvo da 24ª fase da operação, deflagrada no início deste mês. O ex-presidente foi obrigado a prestar depoimento à Polícia Federal após mandado de condução coercitiva expedido pelo juiz federal Sérgio Moro.
Paralelamente à Lava Jato, o Ministério Público de São Paulo pediu na semana passada a prisão preventiva do ex-presidente no caso envolvendo um triplex no Guarujá, no qual é acusado de lavagem de dinheiro e falsidade ideológica.
Para Alejandro Salas, diretor para as Américas da Transparência Internacional, em Berlim, este não é o momento mais adequado para Lula assumir um ministério. Ele diz que, devido à elevada polarização do cenário brasileiro, não é possível evitar que a política de alguma forma contamine o trabalho da Justiça.
"Mas se Lula está convencido de sua inocência, ele não deveria favorecer para que haja esse contexto político que segue gerando problemas e polarização. Ele deveria ter a estatura moral de enfrentar a Justiça e limpar seu nome, e depois seguir com sua carreira política", diz Salas.
Pressionada pelas notícias de que Lula assumirá um ministério, a Bovespa fechou em forte queda nesta terça-feira, e o dólar já acumula alta de 4,79% só nesta semana – em um sinal de que os mercados avaliam de forma negativa a manobra de Dilma.
Nos mercados, é considerado que o retorno de Lula enfraqueceria o processo de impeachment de Dilma e possibilitaria a sobrevida do atual governo. Para muitoas agentes financeiros, uma melhora das perspectivas econômicas passaria necessariamente por uma saída do PT do Planalto.
Autor: Fernando Caulyt
Edição: Rafael Plaisant