Após decisões equivocadas de Dorsey, Cofundador do Twitter, Biz Stone é chamado para tentar ¨salvar¨ o microblogging
No
início, o Twitter era visto, de forma otimista, como uma espécie de pub
digital, aonde você podia ir com amigos, conhecer novas pessoas e
conversar sobre seus interesses.
Mas
como a maioria das redes sociais em 2019, ele agora é visto de uma
forma muito diferente - como um monstro muito mais perigoso.
A
plataforma é um local tóxico para as mulheres, segundo a Anistia
Internacional. O Twitter recebeu o apelido de "servo do autoritarismo"
pela organização. Ofensas direcionadas e partindo de políticos na
plataforma são comuns, assim como o racismo e preconceito.
A
própria conta do Diretor Executivo do Twitter, Jack Dorsey, foi
invadida em agosto por hackers que postaram uma mensagem em defesa de
Adolf Hitler.
Biz
Stone, a autoproclamada "bússola moral" do Twitter, está tentando
descobrir como consertar essa bagunça. "Temos que questionar tudo",
disse ele ao Yahoo Finanças do Reino Unido. "Se queremos sobreviver,
teremos que fazer mudanças".
Stone
foi um dos quatro fundadores do Twitter em 2006, mas saiu da empresa em
2011 para prosseguir com outros projetos. Ele voltou a pedido do CEO e
cofundador, Jack Dorsey, em 2017, durante um período crítico na empresa.
"Foi
basicamente assim: ‘volte aqui e faça com que todos sejam felizes
novamente’", disse Stone. "‘Todo mundo está triste, o preço das ações
está em US$ 13, todo mundo está deixando a empresa, não parece mais algo
tão especial trabalhar no Twitter’. O número de usuários não estava
crescendo, a empresa não estava crescendo, a empresa não era lucrativa.
Foi tipo, ‘o que estamos fazendo aqui?’”
É
uma pergunta que muitas pessoas fora da empresa fizeram ao longo dos
anos. Uma piada comum na rede social é responder a qualquer nova
atualização do Twitter - mais frequentemente apenas algumas pequenas
alterações no design - com a frase: "Apenas se livrem dos nazistas".
Stone pode realmente conseguir colocar o Twitter de volta no caminho certo?
Da esquerda para a direita: os fundadores do Twitter, Jack Dorsey, Biz
Stone e Evan Williams, com o então Diretor Executivo do Twitter, Dick
Costolo, no pregão da Bolsa de Valores de Nova Iorque em novembro de
2013, comemorando a abertura do capital do Twitter. Foto: REUTERS /
Brendan McDermid
Quando
ele retornou para a empresa, Stone não tinha um título ou uma missão
clara, além de "tornar o Twitter um bom lugar novamente". Ele começou
criando um objetivo como missão da plataforma – um norte, para ajudar a
guiar a empresa.
“Nunca
delineamos uma declaração sobre o propósito para o Twitter. Por que o
Twitter existe? Não havia uma resposta”, disse Stone ao Yahoo Finanças
do Reino Unido na cúpula do OneYoungWorld em Londres no mês passado.
“Respondi
à pergunta com: servimos para o bate-papo público. Isso teve um impacto
muito maior na empresa do que eu poderia ter percebido porque era um
propósito muito estimulante.”
“Se
servirmos para fomentar um bate-papo, somos responsáveis por quão
saudável esse bate papo público pode ser. Somos responsáveis pelo
conteúdo da plataforma."
Esta
é uma declaração consideravelmente radical, vindo de um executivo de
uma rede social. O rival Facebook passou anos negando ser editora do seu
conteúdo, com receio das responsabilidades que surgiriam caso assumisse
a responsabilidade pelas postagens dos usuários. O próprio Stone
escreveu um post em um blog em 2011 argumentando que o Twitter também
era apenas uma plataforma e não era responsável pelo que era publicado
nele.
"Somos
como a AT&T: fabricamos telefones e redes, o que as pessoas dizem
sobre o produto não é problema nosso, não nos interessa", é como ele
pensava na época, recorda. Mas desde então, sua posição sobre o assunto
mudou.
"O
que todo mundo quer nos ouvir dizer - e o que é realmente a coisa
eticamente correta a se fazer e dizer - é que somos responsáveis pelo
conteúdo da plataforma", disse Stone. Os advogados do Twitter odiaram
essa mudança de pensamento, disse ele.
"O
argumento que finalmente ganhou foi: eu ainda acredito que a liberdade
de expressão é um direito humano fundamental, mas não acredito que a
liberdade de ter essa fala amplificada pelo Twitter seja um direito
humano", disse Stone. "Você tem que jogar de acordo com as nossas
regras."
"Não levamos em consideração” a manipulação em massa
Parte
da admissão de responsabilidade envolvia levar mais a sério a remoção
de tweets abusivos ou enganosos. Esse sempre foi um ponto fraco da
empresa.
"Estamos
um pouco atrasados", disse Stone. "Nós simplesmente não percebemos essa
manipulação em massa - não chegamos a levar isso em consideração. Eu
não acho que as pessoas tenham realmente se dado conta de que essas
coisas estavam acontecendo até que de repente estava por toda parte,
então tivemos que nos atualizar.”
O
Twitter começou a usar inteligência artificial para eliminar conteúdo
abusivo no ano passado e a empresa afirmou no mês passado que mais de
50% dos tweets abusivos estão sendo removidos antes que usuários os
reportem. O sistema está "funcionando como mágica", segundo Stone.
"Acontece
que na maioria das vezes, se não em 100% do tempo, certos
comportamentos estão sempre ligados a certos tipos de conteúdo", disse
ele. "Se há uma conta que foi registrada hoje, sem uma foto de perfil, e
começou a te mandar tweets centenas de vezes hoje mesmo e você não a
segue, provavelmente é um perfil que está assediando você.”
“Examinamos
centenas, talvez milhares, de sinais usando a inteligência artificial, o
que significa que podemos redimensionar cada vez melhor essa análise. É
definitivamente o caminho certo a ser percorrido.”
Mas
contas falsas e abusivas são apenas parte do problema. Muitos usuários
estão igualmente descontentes com as pessoas reais que postam discursos
de ódio, informações incorretas ou conteúdos extremistas, geralmente sob
a justificativa da liberdade de expressão.
O
presidente dos EUA, Donald Trump, é o exemplo mais óbvio de um
“tuiteiro” problemático. A plataforma tem se esforçado para entender
como tratar Trump, que no passado usou a plataforma para ameaçar o
início de uma guerra com a Coreia do Norte e fazer várias declarações
falsas, de acordo com o PolitiFact do Instituto Poynter.
Logo
após o Yahoo Finanças do Reino Unido falar com Stone, o Twitter
anunciou uma proibição geral de anúncios políticos antes das eleições de
2020 nos EUA. A medida atraiu aplausos da imprensa e contrastou
fortemente com o Facebook, que disse que permitiria até mentiras em
anúncios na plataforma.
No
entanto, os anúncios do Twitter nunca tiveram um impacto político tão
grande quanto os do Facebook e há uma dúvida geral sobre se alguém como
Trump sequer precisaria anunciar na plataforma. O presidente dos EUA tem
66,4 milhões de seguidores no Twitter e é retuitado para outros milhões
a mais.
O Twitter interviria se Trump tuitasse mentiras sobre um outro candidato durante as eleições?
"Com
relação a apenas tweets regulares, temos as regras e a aplicação das
regras", disse Stone. "Se a mentira estiver contida em um tweet, não sei
se isso necessariamente violaria as regras do Twitter.
Talvez você
esteja mentindo em um tweet, mas as pessoas vão ver isso e dizer: ‘você é
um mentiroso, por que está mentindo?’ Mas se você nos pagar para
espalhar sua mentira, é outra história.”
"Precisamos
constantemente analisar essas políticas e regras", acrescentou. Uma
adição recente foi a proibição de retuitar líderes mundiais que violam
as regras da plataforma.
Até
agora, a regra mais proeminente com a qual o presidente americano teve
problemas é em relação às regras dos direitos autorais. Um vídeo viral
que Trump postou sobre o candidato Joe Biden e seu filho Hunter foi
retirado do ar por violar os direitos autorais da banda Nickleback.
Deep fake, 'o novo spam'
O
Twitter ainda está recebendo críticas na imprensa e o preço das ações
recentemente caiu 20%, um dia depois de prejuízos. Mas Stone acha que
ele e seus colegas já fizeram bastante progresso na recuperação da
empresa.
"A
empresa mudou - somos lucrativos, temos dinheiro no banco e o preço das
ações subiu de US$ 13 para cerca de US$ 40", disse Stone. (Desde a
nossa conversa, o valor caiu um pouco e agora está mais próximo dos US$
30 por ação).
“As
pessoas estão felizes, o serviço está melhorando, a empresa está
crescendo. É uma reviravolta completa. Não consigo citar outra empresa
de internet onde esse tipo de recuperação ocorreu em apenas um ano e
meio. Geralmente, elas apenas fecham.”
Depois de recuperar o atraso, Stone agora quer se antecipar à próxima ameaça ao Twitter: os deep fakes.
"Acabamos de divulgar um comunicado sobre o que pensamos acerca de conteúdo sintético – deep fakes,
desinformação", disse ele. "Começamos perguntando a todos que usam o
Twitter qual foi a experiência deles e o que devemos fazer."
Stone
foi ao OneYoungWorld para promover seu investimento na AI Foundation
(Fundação IA), uma startup que cria avatares virtuais com uma
inteligência artificial que consegue aprender sobre a personalidade
dessas pessoas conversando com elas. Stone disse que passou um tempo
conversando com um avatar falso do Obama em seu telefone.
A
experiência o convenceu não apenas do poder dessa tecnologia, mas
também do seu risco. Stone está conversando com a AI Foundation e outras
pessoas deste meio para descobrir como lidar com esse nível de
informações falsas, que conta com vídeos editados para parecer que
alguém está dizendo ou fazendo algo que, na verdade, nunca disse ou fez.
"Sabemos
que isso vai se tornar mais comum", disse Stone. "É como se fosse um
novo spam. É como se você estivesse abrindo uma empresa de e-mail hoje e
não se preocupasse com o problema do spam. Isso já está acontecendo e
vai acontecer ainda mais frequentemente."
"Devemos seguir com a contagem de seguidores?"
Stone também está pensando profundamente em como melhorar o nível geral de diálogo no Twitter.
"O
que realmente queremos que aconteça no Twitter é que mais pessoas
tenham mais conversas, conversas reais onde se escutam, se ouvem e
chegam a algum tipo de entendimento mútuo", disse ele. "Não apenas ‘você
está errado, eu estou certo, você está errado, eu estou certo’."
Uma ideia que ele está planejando seguir é de se livrar da contagem de seguidores nos perfis das pessoas.
"Muito
disso se resume a: o que você incentiva as pessoas a fazer no Twitter?"
disse ele. “Sem realmente perceber, o que incentivamos as pessoas a
fazer é aumentar esse número. Devemos manter esse número? Deveríamos ter
o número de seguidores lá? Ou deveríamos ter algum tipo de indicação do
sucesso dessa pessoa em termos de diálogo?”
O
Twitter lançou no ano passado um projeto para checar o quão "saudáveis"
são as conversas na plataforma, em parcerias com acadêmicos de todo o
mundo. As descobertas podem ajudar a entender como o Twitter vai ser e
funcionar no futuro.
“Sabe
quando você cria uma senha, aparece um indicador de força em relação à
segurança da senha? Eu sempre pensei que seria divertido você digitar um
tweet ou um e-mail ou algo assim - ‘isso é código vermelho, você está
vermelho agora, ficará um pouco mais verde se você usar outro
adjetivo’.”
"Nós
não vamos fazer isso, mas é esse o princípio. Como podemos incentivar
as pessoas a serem mais civilizadas, a ter mais empatia e a ter uma
discussão produtiva? Essas são perguntas difíceis. Não apenas para o
Twitter, mas para o mundo em geral.”