Em reunião secreta: Papa Francisco escolhe novos cardeais antes de renunciar para reformar e preparar Igreja Católica para o NOVO PAPA


Uma reunião sem precedentes, a portas fechadas e sem agenda. A coisa mais próxima de um conclave para a grande maioria dos 229 cardeais – 132 deles, eleitores em uma hipotética eleição papal – que entre segunda e terça-feira se encontrará com o Papa Francisco no Vaticano. Para quê? A única pista oficial foi dada pelo próprio Bergoglio no final de maio, com o anúncio da reunião: "Segunda e terça-feira, 29 e 30 de agosto, haverá uma reunião de cardeais para refletir sobre a nova Constituição Apostólica, Pregar o Evangelho". É o texto que regulamenta a reforma da Cúria.


Até agora, o que se sabe. Isso, e que o Papa presidirá uma missa com todo o Colégio de Cardeais na terça-feira à tarde. Mas sobre o que os cardeais falarão com Bergoglio? Quais são as verdadeiras razões para este encontro, absolutamente extraordinário, em meio a profundas reformas legislativas na Igreja Católica, com um Papa limitado em sua condição física e com cada vez mais ultra vozes contra ele?





Tomando decisões para o futuro

"Esta é uma reunião sem precedentes que servirá, entre outras coisas, para que a maioria dos cardeais que terão que eleger Papa no futuro se encontrem", diz elDiario.es um dos cardeais que já está em Roma para participar da reunião, e que considera que até mesmo uma reunião para explicar as chaves da reforma da Cúria já é extraordinária. Não podemos esquecer os obstáculos que o próprio Vaticano está colocando em prática para a entrada em vigor de uma regulamentação tão ampla que afeta a luta contra a pederastia, a organização interna, a perseguição de más práticas financeiras ou – como tem sido visto recentemente – o apelo à "refundação" da Opus Dei.


Mas o encontro vai mais longe, muito mais longe. No final, tudo parece indicar que se tornará uma reunião para determinar o futuro da Igreja Católica. Uma década após sua eleição como pontífice, em meio ao processo sinodal – o Papa pediu a toda a Igreja que refletisse sobre si mesma, e fizesse propostas – com muitas frentes abertas, desde uma mudança na moralidade sexual até a abertura ao sacerdócio de mulheres casadas ou homens, o papel das mulheres em posições de relevância na Igreja ou a luta contra o abuso sexual de menores e, Além disso, contra os religiosos ao redor do mundo, Francisco quer buscar a opinião de seu "Senado". E tomar decisões para o futuro.


Transformando inimigos em cúmplices

Nunca foi melhor dizer, porque 89 dos 132 cardeais eleitores (com menos de 80 anos) foram nomeados por Francisco, 63% do total: "O número não é trivial: um futuro Papa é eleito com dois terços do conclave", diz um especialista do Vaticano, que, no entanto, não acredita que chegou a hora da renúncia papal. Embora ele acredite que este encontro com os cardeais "pode resultar em futuros candidatos 'estrelas' ou mesmo que Bergoglio possa apontar para seu sucessor, uma vez que os grupos de oposição estão perfeitamente organizados, preparando (e encorajando) um conclave hipotético. "Mas não estamos diante do fim deste pontificado, mas de uma nova etapa", diz o cardeal Maradiaga, coordenador do grupo de cardeais que assessorou o Papa no projeto de reforma da Cúria. Não haverá "fumaça branca" na reunião desta semana.


"Francisco quer que todos os cardeais se envolvam na reforma da Igreja, que vai muito além das mudanças na estrutura da Cúria do Vaticano. E ele também quer ouvir aqueles que não são a favor, que não são muitos, mas eles existem. E este Papa tem a virtude de transformar seus inimigos em 'cúmplices' aponta, em particular, outro dos 'príncipes da Igreja' que participarão da reunião no meio do verão romano, a quem a notícia surpreendeu na época, mas que agora se encaixa dentro do "Pensamento Bergoglio: veja, ouça, juiz ... e, em seguida, agir.


Francis não queria deixar espaço para surpresas, e aqueles que vêm estão protagonizando a si mesmo. Prova disso é o convite para o defenestrado (em setembro fará dois anos desde sua cessação de todas as suas funções cardeais) Angelo Becciu para participar do conclave, como ele mesmo anunciou na semana passada. Uma participação que, como esclareceu a Santa Sé, não implica sua reabilitação, mas um convite pessoal do pontífice para um ato específico.


Becciu e Bolaños

Becciu também participou, neste sábado, do Consistório 'ordinário' no qual Francisco concedeu o roxo a 20 novos cardeais, incluindo o espanhol Fernando Vérgez, presidente do Governo do Vaticano (o 'prefeito' da cidade) e que se tornou o primeiro legionário de Cristo a chegar ao cardinalato.


Com Vérgez, há 12 cardeais espanhóis, o que faz do nosso país o terceiro em número de cardeais, atrás apenas da Itália e dos Estados Unidos. Seis deles (o próprio Vérgez, mais Osoro, Omella, Cañizares, Ladaria e Ayuso), com menos de 80 anos, poderiam eleger Papa. A importância da Espanha no Colégio de Cardeais motivou a presença na cerimônia do Ministro da Presidência, Félix Bolaños, que recentemente se reuniu com o Papa Francisco em Roma. Na véspera de um outono que deverá ser 'quente' nas relações Igreja-Governo, com possíveis desacordos sobre o financiamento à vista, a presença de Bolaños, juntamente com a embaixadora Celáa, não deixou a Secretaria de Estado indiferente. Mas isso é outra história.


No dia seguinte ao consistório, Francisco viajou para L'Aquila, em uma viagem que muitos queriam interpretar como uma "pista" da possível renúncia papal. Por que? Porque Bergoglio veio orar no túmulo de Celestino V, o último papa – antes de Bento XVI – para renunciar ao pontificado. O mito de Celestino, e a crescente preocupação com a saúde de Ratzinger – o Papa emérito poderia estar em último lugar, apontam fontes próximas, embora a verdade seja que neste sábado os novos cardeais, juntamente com Bergoglio, fizeram uma visita de cortesia a Bento XVI, da qual a Santa Sé divulgou várias imagens – somadas aos males do pontífice argentino novamente desencadearam os rumores de uma renúncia papal próxima.


O próprio Francisco, tanto no voo que o trouxe de volta ao Canadá (onde foi visto o tempo todo em uma cadeira de rodas, embora tenha andado novamente com a ajuda de uma bengala) quanto em sucessivas entrevistas, deixou em aberto a possibilidade de renunciar – "não seria uma catástrofe" – quando ele não encontrou força: "Essa porta está aberta, mas por enquanto eu não considerei atravessá-lo.


Entre os 20 novos membros do colégio cardinalício estão 16 eleitores do futuro pontífice - é requisito ter menos de 80 anos de idade para eleger um papa.


Esses novos cardeais "representam a Igreja de hoje, com forte presença no Hemisfério Sul", onde vivem 80% dos católicos, destacou o vaticanista Bernard Lecomte.


Ao final de seu oitavo consistório, quase um para cada ano de seu papado, Francisco terá eleito 83 cardeais do total atual de 132 eleitores, ou seja, quase dois terços. Uma cifra determinante no caso da eleição do próximo papa, já que uma maioria de dois terços é precisamente a necessária.


Os novos cardeais são de todos os cantos do mundo, como o arcebispo de Ekwulobia (Nigéria), Peter Okpaleke; o arcebispo de Goa e Damão (Índia), Filipe Neri Ferrão; o arcebispo de Hyderabad (Índia), Anthony Poola; e o bispo de Wa (Gana), Richard Kuuia Baawobr.


Entre eles estão também dois brasileiros: o arcebispo de Brasília, Paulo Cezar Costa, e o arcebispo de Manaus, Leonardo Ulrich Steiner, que se torna o primeiro cardeal da região amazônica.


Um dos nomes mais surpreendentes entre os nomeados é o do arcebispo Giorgio Marengo, um italiano que se torna o cardeal mais jovem do mundo, com apenas 48 anos, e que administra a Igreja Católica na Mongólia, onde há pouco mais de 1.500 católicos.


Outro que merece destaque é o americano Robert McElroy, bispo de San Diego, na Califórnia, considerado um progressista por suas posições sobre os católicos homossexuais e o direito ao aborto.


O número total de cardeais aumentará para 227, com os eleitores passando de 116 para 132 e os não eleitores, de 91 para 95.


A distribuição geográfica também mudou: por exemplo, em 2013, Ásia e Oceania tinham 11 cardeais eleitores e, após o consistório de sábado, chegarão a 24. Além disso, alguns vêm de áreas onde nunca houve cardeais, como Tonga e Papua Nova Guiné.


A Europa não mudou muito em termos de números, de 60 para 54, embora tenha ocorrido uma queda no número de eleitores cardeais italianos, pois em 2013 eram 28, e no final do próximo ano, quando alguns deles completarem 80 anos, serão 14. 


Originalmente, estava prevista a nomeação de 21 novos cardeais, mas o evento ocorre com um a menos, já que o belga Lucas Van Looy decidiu não aceitar o título.


"Pré-conclave"


O tema principal do consistório extraordinário de segunda e terça-feira será, como indicou o papa, refletir sobre a nova Constituição Apostólica "Praedicate evangelium", que trata da reforma da Cúria, a administração da Igreja Católica.


Alguns vaticanistas acreditam que o papa também possa consultar os cardeais sobre outras questões importantes para a instituição, tais como a elaboração de estatutos que regulamentam a figura do papa emérito.


O consistório sem precedentes, o uso de uma cadeira de rodas pelo papa e a visita de Francisco, no domingo, a Áquila - cidade onde Celestino 5°, o primeiro pontífice a renunciar na história, está enterrado - alimentaram especulações sobre uma renúncia do líder da Igreja Católica em breve.


O jornalista Alberto Melloni afirmou há alguns dias no jornal italiano La Repubblica que o evento tem "um claro sabor de pré-conclave", porque "o papa anunciou repetidamente que a "porta da renúncia está aberta".


"Talvez o papa o tenha convocado para verificar a qualidade dos nomes que escolheu ou para criar um pouco de sociabilidade cardinalícia: mas, certamente, os cardeais nunca viram um consistório como este", declarou.


O padre e jornalista Luis Badilla, que dirige o site Il Sismografo, um dos blogs mais seguidos sobre assuntos do Vaticano, intitulou um de seus artigos sobre o consistório: "Ensaios de conclave".


Badilla estimou, de acordo com os cálculos das reservas nas residências religiosas dedicadas aos purpurados, que é possível prever "uma presença de 145 a 150 cardeais".


"A reunião, independentemente de como seja convocada e apresentada, de fato, canonicamente, será um consistório extraordinário, o segundo deste papa, que em 20 e 21 de fevereiro de 2014 reuniu os cardeais para falar sobre a família e no qual apenas os primeiros 19 cardeais criados por Jorge Bergoglio estiveram presentes", disse.

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