Em Pequim, Emmanuel Macron pede que China de Xi, pressione Putin a negociar com Ucrânia; Kremlin diz que descarta qualquer intervenção Chinesa
Emmanuel Macron não mediu palavras na China. Em encontro com Xi Jinping, realizado nesta quinta-feira em Pequim, o presidente francês deixou claro ao líder da segunda maior potência econômica mundial que o principal motivo de sua visita era fazer com que ele pressionasse o presidente russo, Vladimir Putin, a negociar a paz com a Ucrânia, após um ano e dois meses de conflito. Xi também defendeu negociações, mas evitou comprometer-se.
— Sei que posso contar com você para trazer a Rússia de volta à razão e todos de volta à mesa de negociações — afirmou o presidente francês depois de lembrar o líder chinês de que "a agressão russa na Ucrânia foi um golpe para a estabilidade mundial".
Na visita de Estado, Macron foi recebido com todas as honras, com a Praça da Paz Celestial decorada, um passeio em frente à banda militar e a bandeira francesa pregada no edifício do Grande Salão do Povo, onde o governo chinês costuma celebrar grandes eventos políticos. Lá Xi o recebeu, diante da imponente escadaria.
— O mundo de hoje está passando por uma profunda transformação histórica — afirmou o presidente chinês a Macron, segundo nota oficial do encontro emitida por Pequim, na qual não há referência direta à Ucrânia.
Segundo a declaração chinesa, Xi lembrou que ambos os países são membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, além de "firmes defensores de um mundo multipolar e de uma maior democracia nas relações internacionais". O presidente chinês citou também a responsabilidade de ambos para "superar as diferenças e obstáculos” e “praticar o verdadeiro multilateralismo para a paz, estabilidade e prosperidade mundiais”. Xi, continua a nota, "reafirmou o compromisso" chinês de "facilitar as conversas de paz e a solução política da crise ucraniana" e fez um "apelo conjunto" com Macron para que se evite que a crise saia do controle e que os países assumam o "compromisso solene de não usar armar nucleares", além de "retomarem as negociações de paz o mais rápido possível".
Macron acrescentou que é necessário encontrar "uma paz duradoura" na Ucrânia "que respeite as fronteiras reconhecidas internacionalmente e evite qualquer forma de escalada", segundo o comunicado do Palácio do Eliseu.
— Acho que essa também é uma questão importante para a China, tanto quanto para a França e para a Europa — declarou.
Impulso nas relações bilaterais
O presidente chinês elogiou, ainda, a forma como, apesar da distância imposta pela pandemia de Covid-19, os dois países conseguiram manter "um ímpeto de crescimento positivo e sólido em seus laços bilaterais". E sublinhou que a visita "vai dar um novo impulso e vitalidade às relações entre a China e a Europa", segundo a nota oficial de Pequim.
Macron coordenou a sua visita com a da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, que foi precedida por um discurso muito mais duro do que o dos franceses. Ambos desembarcaram em Pequim na quarta-feira, em voos separados. Uma semana antes de viajar para a China, Von der Leyen acusou o gigante asiático de tentar moldar a ordem internacional ao seu modo. Nesta quinta-feira, ela alertou Pequim contra uma eventual entrega de armas chinesas à Rússia.
— Contamos com a China para não entregar equipamentos militares à Rússia, direta ou indiretamente, porque sabemos todos que armar o agressor iria contra as leis internacionais e prejudicaria consideravelmente nossa relação [com a UE] — disse ela em entrevista coletiva.
Macron e Von der Leyen se reuniram com o primeiro-ministro chinês, Li Qiang, na manhã desta quinta-feira. Dirigindo-se a Macron, Li disse a ele que era o primeiro líder de uma grande nação ocidental a ser recebido pela China após o início do inédito terceiro mandato de Xi como presidente chinês.
— Isso mostra a importância das relações China-França — disse o premier Li em seu discurso de abertura, segundo o jornal de Hong Kong South China Morning Post.
Nesse encontro, que serviu de preâmbulo ao encontro com Xi, Macron evocou ainda a guerra na Ucrânia e a questão do acesso das empresas francesas ao mercado chinês, “particularmente nos setores aeronáutico, agroalimentar e financeiro”, segundo informou o Executivo francês por meio de comunicado.
Rússia descarta mediação da China
Por sua vez, o Kremlin descartou nesta quinta-feira a possibilidade de a China mediar um cessar-fogo com a Ucrânia, após Macron, declarar, em visita a Pequim, que gostaria que Xi Jinping ajudasse seu país a “trazer a Rússia à razão”.
— Claro, a China tem um potencial tremendo e eficaz em termos de serviços de mediação. Mas a situação com a Ucrânia é complexa, no momento não há perspectiva de solução política. E, no momento, não temos outra solução senão continuar com a "operação especial" — disse o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, a repórteres, usando o termo com que o governo russo se refere à invasão da Ucrânia.
Xi visitou Moscou no mês passado e, durante sua visita, o líder chinês e o líder russo mostraram uma frente unida contra o Ocidente.
A China divulgou em fins de fevereiro seu posicionamento sobre a guerra na Ucrânia, defendendo a integridade territorial da Ucrânia — mas sem esclarecer como o princípio se aplicaria aos territórios ucranianos anexados pela Rússia — e propondo o levantamento de sanções aplicadas a Moscou. A proposta é vaga e foi rejeitada imediatamente pelos Estados Unidos, sob a alegação de que abriria caminho para a Rússia manter os territórios anexados.