Em reunião na Universidade de Harvard, Jared Kushner sugere construção de casas a beira mar para que sejam valiosas quando conflito entre Israel, Hamas e Palestina terminarem
O genro do ex-presidente e candidato à Casa Branca Donald Trump, Jared Kushner, sugeriu em 08/03/2024 que casas construídas de frente para o mar na Faixa de Gaza “poderia ser valiosas”, ao mesmo tempo em que sugeriu que a população civil do território palestino seja removida para o Deserto do Negev.
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— As propriedades de frente para o mar em Gaza poderiam ser valiosas, se as pessoas se concentrarem na construção de vizinhanças — disse Kushner, em um evento na Universidade Harvard, no dia 8 de março. — É uma situação um pouco infeliz aqui, mas pela perspectiva de Israel, eu faria o meu melhor para tirar as pessoas dali e então limpar tudo. Mas não creio que Israel tenha declarado que não quer que as pessoas voltem para lá depois.
Kushner, cuja família fez bilhões com negócios no setor imobiliário, e que está realizando empreendimentos na Albânia e Sérvia, defendeu ainda que as autoridades israelenses retirem a população de Gaza para realizar a “limpeza” do território. De acordo com a agência da ONU para os palestinos, a UNRWA, há cerca de 23 milhões de toneladas de escombros e munições não detonadas em Gaza, o que levaria “anos” para ser retirado. Desde 2005 não há mais assentamentos judaicos no enclave palestino.
— Eu faria alguma coisa no [Deserto do] Negev. Tentaria levar as pessoas para lá. Acho que é a melhor opção, você poderia ir lá [para Gaza] e terminar o trabalho — disse Kushner, segundo as gravações obtidas pelo Guardian. — Acho que abrir o Negev, criando uma área segura por lá, tirando os civis [de Gaza] e depois terminar o trabalho seria o movimento correto.
A ideia de retirar a população civil de Gaza circula há alguns meses dentro do círculo do premier Benjamin Netanyahu, e é defendida com mais ênfase por elementos ligados à extrema direita, como os ministros Itamar Ben-Gvir e Bezalel Smotrich — em janeiro, Ben-Gvir disse que adotaria um plano de "emigração voluntária", prevendo a saída de "centenas de milhares de palestinos". Apesar de Netanyahu ter declarado que não pretende retomar a presença israelense em Gaza, como aconteceu até 2005, há planos públicos para a construção de colônias judaicas, incluindo propriedades de frente para o mar, como sugeriu Kushner.
O genro de Trump também se disse simpático à ideia de levar parte dos palestinos para o Egito, algo que o governo do Cairo e os próprios palestinos rejeitam, alegando que seria a mera transferência de uma crise humanitária para o território egípcio e, ainda pior, a virtual abdicação de qualquer soberania palestina sobre Gaza. Ao mesmo tempo em que Kushner se disse contrário à criação de um Estado palestino, ele reconheceu que existe a possibilidade de, caso a população seja transferida, Netanyahu vete seu retorno ao enclave.
Jared Kushner, casado com Ivanka Trump, teve papel central na elaboração dos chamados Acordos de Abraão, que viabilizaram a normalização de relações entre Israel, Emirados Árabes Unidos e Bahrein, em 2020, uma iniciativa celebrada pelo ex-presidente e que foi vista como mais um passo para o isolamento regional do Irã. Kushner também trabalhou pelo estreitamento dos laços com a Arábia Saudita, com o eventual objetivo de normalizar os laços do país com os israelenses. Fora da Casa Branca, se tornou público um investimento de US$ 2 bilhões (R$ 10,06 bilhões) feito pelo fundo soberano saudita na empresa dele — Kushner nega qualquer tipo de conflito de interesse no caso.
Além de sugerir eventuais interesses imobiliários em Gaza, a fala de Kushner, que é próximo a Trump, pode dar pistas sobre como o republicano atuará caso volte à Presidência em novembro. Em 2020, ele divulgou uma proposta de plano de paz que foi considerada extremamente favorável a Israel, e que na prática inviabilizava um Estado palestino, e os Acordos de Abraão também omitiram os palestinos e seu pleito por um governo independente. Recentemente, afirmou que os israelenses precisam “terminar o trabalho” em Gaza, se declarando contra um cessar-fogo, e disse que a postura dos EUA na guerra — considerada pró-Israel — estava deixando o aliado em maus lençóis.